14 maio 2009

Como alcançar uma visão mundiocêntrica?

Um dos assuntos que mais me instiga e inspira há tempos é a importância do desenvolvimento integral das pessoas - aquele capaz de atender ao seu aprimoramento no plano fisico, mental e espiritual para o alcance da sistentabilidade global.
Vejo que essa é a questão central e indispensável para que um dia a humanidade possa entrar num sistema de colaboração que permirá realizar as mudanças necessárias rumo a um modelo sustentável de desenvolvimento. Todas as formas de diagnóstico já foram feitas e já se sabe que o mundo dispõe de conhecimento (teórico, técnico, científico) e de recursos (humanos, financeiros, etc) para mudar o que tem que ser mudado. Ou, pelo menos, para alavancar um processo consistente neste sentido. O grande impedimento é de ordem espiritual (entendida como aqui uma forma muito ampliada da "moral"), que pauta seus reflexos no mental, e daí decorre nas formas de interações sociais e com o ambiente. Pois, como as pessoas hoje não se identificam o próprio espírito - a grande maioria atua no mundo com um apanhado de carne e cérebro que luta por possuir somente a matéria, e sob uma perspectiva totalmente egocentrica (o "eu" no centro de tudo, o "meu" interesse primeiro). Nesta perspectiva fica de fato impossível olhar o mundo sob a perspectiva mundiocentrica sob a qual o Ser passa a se identificar com o todo e então, a favor do todo pauta as suas ações. E esta transmigração no olhar não é algo que se possa controlar pela razão. Trata-se de lente sob a qual cada um vê o mundo. Somente o desenvolvimento espiritual, a amergencia de uma nova consciencia no sentido mais amplo da palavra, é capaz de dar conta de transformar as pessoas de dentro para fora, e numa escala global, transformar toda a sociedade.

O texto abaixo, oriundo da Comunida Bahá'í, discorre que forma profunda e ao mesmo sintética sobre o tema, e com muita satisfação compartilho com vcs:


"O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E O ESPÍRITO HUMANO

Adaptação da declaração apresentada à Cúpula da Terra
(Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento)
Rio de Janeiro, Brasil.
Acima de questões técnicas e políticas tais como os limites a serem estabelecidos para a emissão de gases do efeito estufa, como promover o desenvolvimento sustentável, e quem pagará a conta, a pergunta fundamental com que se defronta a comunidade mundial é esta: Pode a humanidade, com seus padrões arraigados de conflito, egoísmo e conduta tacanha, comprometer-se com uma cooperação esclarecida e com um planejamento de longo prazo em escala global?
O processo da Cúpula da Terra realçou tanto a complexidade como a interdependência dos problemas que a humanidade enfrenta. Nenhum desses problemas - as iniquidades debilitadoras do desenvolvimento, as ameaças apocalípticas do aquecimento atmosférico e da destruição da camada de ozônio, a opressão da mulher, o abandono de crianças e poulações marginalizadas, para citar apenas alguns - pode ser abordado com realismo sem que se considerem todos os demais. É impossível solucionar qualquer um deles sem uma magnitude de cooperação e coordenação em todos os níveis que ultrapassa em muito qualquer esforço anterior da experiência coletiva da humanidade.
O potencial para tal cooperação, entretanto, é solapado pela distorção geral do caráter humano. Embora não sejam comumente discutidas no contexto dos desafios do meio ambiente e do desenvolvimento, vigoram no mundo atual certas tendências - que incluem a carência generalizada de disciplina moral, a glorificação da ambição e da acumulação material, a destruição crescente da família e das comunidades, o alastramento da anarquia e da desordem, a ascensão do racismo e do fanatismo, e a atribuição de prioridades a interesse nacionais em detrimento do bem-estar da humanidade - as quais todas, sem excessão , destroem a confiança mútua, alicerce da cooperação.
A reversão dessas tendências destrutivas é essencial para o estabelecimento da unidade e da cooperação. Isso exigirá uma compreensão mais profunda da natureza humana; pois embora a economia, a política, a sociologia e a ciência ofereçam ferramentas importantes para a abordagem das crises interdependentes que afligem a humanidade, uma verdadeira superação do estado de perigo em que se encontram os assuntos humanos só poderá ser levada a efeito quando a dimensão espiritual da natureza humana for levada em conta e o coração humano, transformado.
Embora certos aspectos místicos não sejam fáceis de explicar, a dimensão espiritual da natureza humana pode ser compreendida, em termos práticos, como a fonte das qualidades que transcendem a estreiteza do interesse próprio. Tais qualidades compreendem o amor, a compaixão, a tolerância, a fidedignidade, a coragem, a humildade, a cooperação e a vontade de sacrificar-se pelo bem comum - qualidades de uma cidadania esclarecida, capaz de construir uma civilização mundial unificada.
As transformações profundas e de vasto alcance, a unidade e a cooperação sem precedentes, necessárias à reorientação do mundo rumo a um futuro de justiça e sustentável quanto ao meio ambiente, só serão possíveis tocando-se o espírito humano, apelando-se àqueles valores universais que, por si só, podem capacitar os indivíduos e os povos a agir em conformidade com os interesses de longo prazo do planeta e do gênero humano como um todo. Uma vez explorada, essa fonte poderosa e dinâmica de motivação individual e coletiva liberará um espírito tão profundo e salutar entre os povos da Terra que poder algum será capaz de resistir à sua força unificadora.
A verdade espiritual fundamental da nossa era é a unidade da humanidade. A aceitação universal desse princípio - com suas implicações em relação à justiça social e econômica, à participação universal em processos decisórios insentos de antagonismo, à paz e segurança coletiva, à igualdade dos sexos e à educação universal - possibilitará a reorganização e administração do mundo como um só país, o lar da humanidade. Há mais de cem anos atrás, Bahá’u’lláh conclamou os governantes e povos da terra a tornarem sua visão mundialmente abrangente: "Que não se vanglorie quem ama seu próprio país, mas sim, quem ama o mundo inteiro". Este desafio ainda deve ser atendido."
Fonte: http://www.bahai.org.br/virtual/EmaDes.htm
Bahá’í International Community Office of the Environment 866 United Nations Plaza, suíte 120 New York, NY 10017 USA Tel: 212-756-3500 Fax: 212-756-3573

15 abril 2009

"Shift In Action"

Quanto mais leio sobre sustentabilidade corporativa, desafios ao desenvolvimento sustentável, crise do sistema financeiro e questões socioambientais relevantes (ufa....aja paciência), como o aquecimento global e as (não-)medidas que (não)estão sendo tomadas para tentar mitigar as mudanças climáticas, mais me deparo com a mesma questão central: a noção de interdependência e interconectividade, que mais cedo ou mais tarde "amarra" todas as discussões. Muita verborragia se usa para explicar coisas tão simples, e no final se chega as mesmas conclusões tão singelas de sempre - todos querem, no fundo e por diversos meios, ser felizes, ter uma boa saúde, garantir o futuro dos filhos (alem do seu próprio), se sentir bem. Como ter o simples, hoje, é cada vez mais complexo, fica evidente que para garantir o básico - estar bem neste mundo -, não podemos destruir a nossa Casa, e que tudo depende das pessoas. E que o mundo está como está por que as pessoas pensam que vão suprir seus ideais de felicidade e bem-estar consumindo, consumindo.... It's all about people. E tudo depende da tal "conscientização". Palavrinha comum hoje em dia, embora ainda não assimilada ou compreendida na sua essência. Para começarmos a entender o que é consciência, é preciso olhar para dentro de si. Aprender a ficar em silêncio, meditar. Sem ler, sem falar, apenas se auto-observar, e então acessar um campo infinito de possibilidades, de criatividade, de paz de espírito (sim, para quem acompanha, sou mega entusiasta do autor Deepack Chopra, pois nele vejo a filosofia das vivências que tenho passado). Mas isso pouca gente quer enfrentar. Não é mais gostoso sentar no sofá, pegar o controle remoto...pedir um junk pelo tel.? Depois, o resto se joga no lixo (vejam Ilha das Flores, de Jorge Furtado, link neste blog, para entender o que é lixo).
No afã de encontrar a saída para este pesadelo mundial que nos metemos, tem um movimento muito grande acontecendo, de gente que enxerga no momento atual da Humanidade o limiar de uma crise sistêmica, que observada sob uma perspectiva histórica, se trata da crise de uma civilização que potencialmente levará a nossa ao fim, como muitos outros grandes impérios já se foram - egípcios, persas, mouros, romanos....a única forma de evitar que a nossa sociedade acabe (pq o planeta não vai acabar, quem está correndo risco aqui é a nossa espécie mesmo, a biosfera encontrará uma forma de sobrevivência, de adaptação e de nova evolução, mesmo que a partir de poucos ratos e baratas sobreviventes, a despeito da nossa ignorância) é uma mudança de comportamento em escala global, e sendo o comportamento o reflexo das visões de mundo, da cultura, da educação, da autopercepção (autoconhecimento), a mudança na consciência é a resposta, pois tudo tem que mudar de dentro para fora.
Hoje aderi a uma campanha que parece ser muito séria, o "Shift in Action", e me tornei membro do IONS - Institute of Noetic Ciences, que está encampando o movimento, e comprei o livro "Global Shift" (por apenas U$ 1!!), que explora justamente essa visão da filosofia integral, a sociedade centrada na interdependencia e a ampliação da consciência e formação de novas lideranças como chave do processo de alcance de um modelo sustentável, tem mil redes sociais sobre o tema.....estou animada! Melhor pensar que ainda há jeito, senão, como que a agente toma coragem de colocar um filho nesse mundo? Ainda tenho 32 anos e nenhum dos meus irmãos ou primos pensa em encerrar a família por aqui.
Para se plugar: www.shiftinaction.com

25 março 2009

A vida vem em ondas.....

Recentemente falei neste blog sobre crise e entrega. Hj o tema volta, ainda mais forte, por meio deste texto de Sri Aurobindo, que recebi dos queridos colegas de Kriya Yoga aqui do Brasil. Achei profundo, de tirar o fôlego, especialmente diante da época insustentável e desafiadora que vivemos, onde sobra diagnóstico e falta plano de ação. Compartilho para que cada um possa sentir onde ele toca:

"A Hora De Deus

Existem momentos quando o Espírito se move entre os homens e a Respiração de Deus abrange todas as águas de nosso ser; existem outros onde Ele se retira e os homens são deixados a agir com a força ou a fraqueza de seu próprio egoísmo. O primeiro acontece em períodos que mesmo qualquer pequeno esforço produz grandes resultados e muda o destino; o segundo acontece e são espaços de tempo quando muito trabalho gera pequeno ou nenhum resultado. É verdade que o último sempre prepara o primeiro, que a pequena fumaça de sacrifícios sobe aos Céus pedindo a Deus sua generosidade.

Infeliz é o homem ou nação que quando os momentos divinos acontecem, se encontram dormindo ou despreparados para desfrutá-los, pois o pavio de sua lamparina não foi mantido aparado para dar boas vindas e os ouvidos ficaram selados ao chamado. Mas três vezes pior é para os fortes e prontos, que ainda assim, desperdiçam força e perdem o momento; para estes a perda é irreparável ou uma grande destruição.

Na Hora de Deus, purifique sua alma de toda falsidade e hipocrisia e da auto comiseração vaidosa e que você possa olhar diretamente dentro de seu espírito e ouvir aquilo que te chama. Toda a sua natureza insincera, outrora sua defesa contra o olho do Mestre e a luz do ideal, se tornou agora um buraco em sua armadura e atrai a pancada. Mesmo que tenha conseguido segurá-la neste momento, é pior para você, pois a pancada vem mais tarde e vai jogá-lo ao chão no meio de seu triunfo. Mas quando puro, jogue todo o medo para fora; pois a hora é sempre terrível, um incêndio, um tornado ou uma tempestade, uma prensa forte como uma pisada que vem da ira de Deus; mas aquele que consegue ficar em pé, na verdade de seu propósito é quem deve se destacar; mesmo que caia, ele se levantará novamente; mesmo que pareça que passe pelas asas do vento, ele irá retornar. Também não deixe que a prudência mundana fale muito de perto ao seu ouvido; pois esta é a hora do inesperado, do incalculável, do imensurável. Não meça o poder da Respiração por seus instrumentos minúsculos, mas confie e vá em frente.

Mas mantenha sua alma límpida, em todos os instantes, dos clamores do ego. Então um fogo marchará diante de ti à noite, deixe que a tempestade seja sua amiga e sua bandeira irá tremular nas maiores alturas da grandeza que deve ser conquistada."

Sri Aurobindo
(escreveu cerca de 1918)

06 março 2009

Dia Internacional de Qual Mulher?

Neste Dia 8 de março, achei oportuno fazer uma breve reflexão sobre o modelo de mulher que emerge neste início de século. Na verdade, este é um debate muito amplo para este espaço. E pertinente, dada a participação, cada vez maior, das mulheres no mercado de trabalho e as mudanças em curso em relação ao papel que ela desempenha no relacionamento afetivo, na família, na comunidade. Hoje, felizmente muitas mulheres estão questionando e até mesmo abandonando o rótulo de "Mulher Maravilha", de "mulher-Madona", aquela que tudo pode, que tudo manda...que trabalha 12 horas por dia - ou mais, que administra (a distância) a rotina (estressada) dos filhos, que cuida do marido (na verdade, se preocupa em cuidar, mas não tem tempo para isso, ou está sem tempo para ter um companheiro), que corre do supermercado ao shopping e enche a sua casa de comida industrializada, tudo muito prático, assim gera montanhas de lixo todos os dias. Vive ansiosa e preocupada com a estética. Usa cada minuto possível para correr para a academia, ou fica encanada por não cuidar do seu bem estar e ver sua forma física piorar a cada ano. Não vai a praia a meses, e não pisa na terra há anos! Tem mil coisas para cuidar, e nunca se lembra de lembrar de si mesma.
Que mulher é essa que criamos? No afã de ter igualdade com os homens, as mulheres acabaram assumindo um papel estressante, insustentável, que a afasta de sua verdadeira essência e que até mesmo afasta os próprios homens, pois os deixa acuados.
Ano passado, eu e minha irmã Juliana Raposo, que é uma jornalista muito talentosa, encerramos uma sociedade de sete anos num business de comunicação corporativa e cada uma foi em busca de um reequilíbrio na vida. Largamos mão do suposto glamour de ter a agenda cheia de eventos e de jantar coquetel quase que diariamente. Dos terninhos (muitos de polyester, urg!), dos saltinhos Chanell, da jornada de 12 horas diárias, dos grandes questionamentos internos. Fomos em busca de um novo modelo, que integrasse as diversas facetas de cada uma, reunindo de forma mais harmoniosa família, trabalho, amigos, romance, estudo, autoconhecimento, espiritualidade, contribuição para a sociedade. Pois não existe vida profissional, vida pessoal, vida familiar....existe VIDA!
Hoje trabalho para viver (e não o "vice-versa"), combino atividades que são prazerosas. É mágico poder curtir uma segunda-feira no escritório, sem aquela pressa de que chegue logo o final de semana. Juliana vive no sitio e está empreendendo um negócio de queijos de cabra, com criação e produção artesanal - são as Delicias do Bosque! Um sucesso. Ela vive feliz, sua pele nunca esteve tão bonita. Ela te olha nos olhos, te escuta, tem alegria de viver. Não somos mais aquele poço de estresse, ratinhas correndo atrás da cauda.
Muitas mulheres ainda perseguem o modelo de ser a executiva-mãe-toda-poderosa, e acabam gastando boa parte do supersalário em contas de psicanalistas e clínicas de estética. Nada contra os terapeutas, fiz muita terapia já (na época em que fui executiva!).
Não acredito em certo e errado, ou no modelo de vida ideal, mas estamos quase em 2010, e cinquenta anos após a "Revolução Feminista", já parece ser hora de a mulher se reconectar, ao menos um pouquinho, com a Mãe Natureza , e resgatar sua identidade verdadeiramente feminina, de companheira-colaboradora dos homens - e não sua competidora-destruidora. E usar a sua grande habilidade de administrar múltiplas questões simultaneamente e sua visão sistêmica em prol da construção de uma sociedade mais equilibrada, pois sustentabilidade é perenidade, e essa busca passa também pela relações, não basta colocar as embalagens na lixeira reciclável do apartamento.

Abaixo compartilho um artigo sobre esse tema, um lindo testemunho da jornalista Giuliana Capello, que também mostra, na prática, como é possível ser bem sucedida sem deixar de ser Mulher.

Por Giuliana Capello
"Mas você vai largar a carreira de jornalista para ser dona-de-casa no meio do mato?” Muitas amigas já me fizeram essa pergunta, indignadas com minha opção de viver numa ecovila e de não cultivar, digamos assim, muitas ambições profissionais (embora eu não esteja pensando em abandonar o jornalismo).
É inegável que as mudanças que tenho feito na minha vida, para ter um dia-a-dia mais coerente com meu discurso, levam-me a uma reflexão profunda sobre a ideia de feminismo, de ser mulher no século XXI, de ser ou não ser mãe, de ter um trabalho bem remunerado, de ser feminina sem ser vulgar, de ter voz entre os homens, e por aí vai. Até porque sei - e sinto - que estou na contramão da maioria e que meu caminho não é, nem de longe, sequer desejado por muitas mulheres.
Às vezes, fico pensando: será que estou cometendo alguma falta contra as mulheres que lutaram e ainda lutam por mais igualdade, respeito e espaço no mundo?!? Será que querer viver de um jeito mais simples, mais ligado à terra e aos amigos depõe contra a noção de libertação da mulher? Que mulher é essa que eu cultivo em mim que não acha demérito passar mais tempo no escritório montado em casa e cuidando de afazeres domésticos do que na empresa (e, por consequência, no trânsito, em restaurantes self-service e no shopping center comprando roupas para manter uma boa imagem entre os colegas)?
Vamos por partes. Não vou abandonar o trabalho remunerado. Apenas não é meu desejo passar os dias numa redação, sentada na frente do computador, sob o ar-condicionado e a tensão dos prazos curtíssimos. Tenho me esforçado para conseguir trabalhos que poderão ser levados para a ecovila - como este blog aqui, por exemplo, e as resenhas de livros que tenho feito para a seção Estante deste site. Ou seja, não estou abrindo mão da minha profissão; estou tão somente reestruturando o peso que esse aspecto tem e terá daqui para frente.
O trabalho fora de casa não precisa ser a razão de nossa existência. Isso não é libertação nem para mulheres nem para homens! Sinceramente, a mulher fez a revolução lá nos anos 60, quando queimou sutiãs, descobriu a pílula, usou roupas masculinas e saiu às ruas gritando “posso fazer tudo que um homem faz”. É claro que ainda existe discriminação de gênero no planeta. Mas sair de uma condição de subjugação para outra (a da dupla ou tripla jornada, a da ditadura da juventude ou da executiva estressada) não me parece ser exatamente um grande avanço.
Talvez as mulheres tenham radicalizado demais. Quiseram tanto ser igual aos homens que simplesmente execraram alguns saberes importantes pelo caminho. Cozinhar, bordar, cuidar dos filhos e do marido virou coisa de avó e de mulherzinha atrasada. Afinal, ter uma agenda cheia é que é sinônimo de mulher bem-sucedida. E olha que não vale aqui agenda cheia de compromissos ligados ao lar, hein! Nada de supermercado, padaria, sapateiro ou costureira. O negócio da mulher deste século é frequentar academia de ginástica e ter dinheiro para pagar pelos bisturis mágicos das clínicas de estética. Será?
Será mesmo que essa mulher foi libertada? Tenho minhas dúvidas. Penso que, passada a fase do feminismo original, está mais do que na hora de abrir uma temporada de balanço. Ser dona-de-casa não é palavrão nem castigo. Ainda mais se for algo voluntário. Tem muita mulher fazendo essa opção hoje em dia...
Lá na ecovila, acredito que isso poderá até ser um prazer. Acordar cedo, preparar o café da manhã, dividir as tarefas do dia com o companheiro (sim, os homens também mudaram muito!), encontrar outras mulheres da comunidade para fazer pão, costurar, pintar, plantar, dançar, praticar yoga, cuidar das crianças.
Confio muito na enorme capacidade que temos de aprender novas habilidades a cada dia e de sermos pessoas mais inteiras à medida que conseguimos dar vazão ao nosso lado criativo. Tenho fome de aprender coisas novas (que, na verdade, são bem antigas) e...inusitadas. Quer ver um exemplo? Minha avó está me ensinando a costurar. Quando eu era criança, a Sinhá dava aulas para um punhado de mulheres. E eu sempre achei o máximo essa história de pegar um pedaço de tecido e transformá-lo em roupa. Então, resolvi tentar (já falei sobre isso aqui no blog). E não é que estou conseguindo aprender?! Já fiz lençóis, uma cortina para banheiro, uma saia e uma blusa. Tenho certeza, esse saber terá um valor imenso quando eu estiver morando na ecovila.
Na mesma toada, tenho me dedicado a aprender a cozinhar mais e melhor. Já faço vários pratos vegetarianos e me viro bem. Mas com a horta e o pomar comunitários da ecovila, vou querer aprender a desidratar frutas, fazer doces, compotas, conservas etc.
Também ando estudando violão, por conta própria. Estudei piano dos seis aos quinze anos de idade, mas sempre soube que eu não conseguiria alegrar uma festa tocando Bach, Mozart ou Liszt. Então, seguindo a trilha do meu pai, que é músico, e do meu avô, que morreu como um excelente bandolinista, escolhi o instrumento de cordas como aliado para futuros encontros entre amigos.
Por último, ingressei num curso de formação em yoga. Já pratico há uns três ou quatro anos, mas sentia falta de aprofundar o conhecimento sobre essa filosofia milenar. Ainda não sei dizer se vou me tornar professora de yoga. Mas, ao menos, sei que poderei oferecer práticas diárias para a comunidade da ecovila.
Em resumo, meu caminho tem sido encontrar maneiras de me conhecer e me realizar mais plenamente. Não tenho receio de parecer antiquada ou mesmo maluca. Sei que estou tentando trilhar um caminho diferente, em que cada passo é dado lentamente, dia após dia. Mas sei também que poderei contar com meu companheiro e com minhas amigas da ecovila. Posso não ser fã ardorosa de uma vassoura, mas se ela for o passaporte para um cotidiano mais pacífico e cheio de sentido, sei que posso encará-la sem problemas...

Fonte: http://planetasustentavel.abril.uol.com.br/blog/gaiatos/index.shtml